Acta da reunião de estudantes de psicologia com a APSIC - 6/Julho/2010 (2ª versão)
Achámos que fazia sentido começar a reunião com oração (Avé Maria e intenções). Estávamos sentados no terraço do CAES, ao ar livre enquanto anoitecia, apresentando-nos e partilhando as nossas expectativas e razões para estarmos ali. Surgiram pela conversa as experiências que tivemos com movimentos e instituições, tais como retiros de introdução à fé.
Passando para o interior, fluíram uma série de temas e experiências. Falámos dos temas que mais se relacionam com uma abertura ao que é distintamente humano (e divino), por exemplo: a busca pessoal pelo sentido da vida, a esperança, o amor incondicional, a responsabilidade pessoal, as virtudes, etc. Introduzimos para isso os 3 principais modelos psicoterapêuticos que conhecemos:
Estes modelos não foram destacados pela sua exclusividade, ou seja, como sendo "a" psicologia católica, mas sim pela antropologia filosófica que está na sua base, isto é, a noção de identidade e potencialidade humana implicada nas suas características tais como racionalidade, liberdade e forma de amar. É sobretudo a abertura a aspectos existenciais fundamentais, que se expressa na possibilidade de integração do espiritual no processo terapêutico e também potenciar mais profundamente a cura através da própria fé.
No entanto, aludimos a como certas escolas, nomeadamente os principais autores da Humanista ou Centrada na Pessoa (Rogers, Maslow, Fromm, May), eram frontalmente hostis à religião. A importância e impacto da filosofia bem como dos movimentos culturais e ideológicos sobre a criação de modelos psicológicos e psicoterapêuticos foram assim referenciados brevemente, uma vez que ainda não chegámos a aprofundar esse tema, sobre o qual há coisas importantíssimas a conhecer, nomeadamente certos pensadores na história da psicologia (como William James, Franz Brentano, Rudolf Allers ou Victor White).
A postura crítica em trabalhos científicos sofre com a desconsideração ideológica da religião, enviesando os instrumentos, resultados e conclusões dos estudos, pelo que uma abordagem e discussão católica dos mesmos contribui para um avanço científico mais autêntico. A nível político e da educação, o impacto da psicologia é determinante, pelo que, sem essa dimensão científica, a liberdade religiosa tal como a objecção de consciência são continuamente postas em causa devido ao facto simples de que a Igreja conhece, realmente, a verdade sobre o ser humano e a verdade não se contradiz a si mesma. Assim, oposição à visão fundamental da Igreja terá sempre um resultado prático prejudicial à sociedade. Esta visão pode ser sistematizada na lei moral natural, por princípio acessível a qualquer pessoa de boa-vontade.
Em geral, o campo da psicologia clínica tende a analisar as pessoas individualmente e foca-se na psicopatologia do indivíduo. Uma psicologia católica reconhece a importância da vida interior do indivíduo e a realidade da psicopatologia, mas dá mais importância à natureza relacional da pessoa e em como o cliente pode crescer em virtude. Isto implica ver não só o indivíduo mas uma pessoa situada na sua vocação, sobretudo como filho, esposo e pai. Além disso, o foco de uma psicologia católica não é o de apenas aliviar sintomas ou psicopatologias, mas ajudar o cliente a florescer pessoal e interpessoalmente, ou seja, em sentido geral foca-se na sua relação com a sociedade e em última análise na sua relação com Deus (recorro ao terapeuta familiar e investigador católico William Nordling para esta definição).
Esta perspectiva é muito oportuna por estar a ser actualmente popularizada no domínio científico em áreas relacionadas com os temas abordados pela psicologia positiva (Seligman) ou do bem-estar (well-being), em parte por reacção ao que, quanto ao individualismo, já se chamou "cultura do narcisismo" em psicologia, e, quanto ao foco na psicopatologia, descontentamentos de vários tipos tais como a crítica ao comportamentalismo (Skinner) em paralelo com por exemplo o movimento antipsiquiátrico. A noção de que há algo de positivo representa um avanço importante que é a afirmação de que nem tudo é relativo, bem como manifestar que a pessoa se pode transformar em algo melhor. No entanto, nem tudo é "positivo" pois o foco na eficácia, desempenho e felicidade pessoal também podem facilitar novos tipos de narcisismo ou da procura de aceitação afastada da noção da entrega pessoal e do amor.
A propósito disto, a Rosário descreveu a teoria de Fred Luthans sobre "capital psicológico positivo" (PsyCap) em psicologia social e organizacional, cujos componentes principais são Autoconfiança (Self-Efficacy), Esperança, Optimismo e Resiliência. Encontrámos nestas "virtudes" semelhanças passíveis de integração com os 3 modelos inicialmente falados e não só, tendo aplicações a outros níveis. Por exemplo, pode salientar-se a actual importância da Esperança na teoria do Recovery em psicologia comunitária e reabilitação social que tem mudado políticas sociais - dá-se relevo a que não são raras as pessoas que ultrapassam as dificuldades inibitórias da sua experiência de doença mental, baseando-se em estudos longitudinais que confirmam o sucesso da transformação (mesmo que demore décadas), e que por isso é preciso assumir que tal mudança é possível, desejada e apoiada pela sociedade.
Falámos também sobre investigação realizada por Theresa Burke e David Reardon (Forbidden Grief: The Unspoken Pain of Abortion - http://www.amazon.com/dp/096489579X/ + http://www.amazon.com/dp/0964895781/), e a associação que Burke estudou entre as mulheres "histéricas" de Freud e a sua experiência de aborto.
Vai ser realizado um retiro das "Vinhas de Raquel" para trabalhar a cura do síndrome pós-aborto em Setembro! Se conhecem alguém que tenha sofrido, eram bom falarem com a Maria José de modo a procurar convidá-las!
Também falámos, neste enquadramento, sobre a própria possibilidade de mudar a orientação sexual. Este é talvez o tema que mais atentamente devemos contextualizar, tendo em conta os efeitos perniciosos, para a ciência e sociedade, da ideologia de quem admite apenas a liberalização sexual - da qual a homossexualidade é uma parte importante. Ou seja, a importância prática desta questão inclui-se para a Igreja na castidade: vigilância sobre os nossos próprios desejos, especialmente aqueles que não queremos nem devemos ter, no meio de uma sociedade que nos diz que só há sentido em os satisfazermos, não contrariá-los ou direccioná-los. Isto implica um cuidado pastoral que se pauta por procurar compreender a pessoa (as suas circunstâncias, motivações, etc) e desde logo fomentar nela o sentido da castidade na sua condição particular. A pessoa é aceite tal como é, mas quem quer seguir a Cristo precisa carregar a sua cruz; a questão dos esforços de mudança de orientação merece apoio mas, à partida, trata-se de aceitação de uma realidade maior do que os limites da nossa vida, em vários sentidos. No entanto, tem uma particularidade própria (não só pessoal mas também dimensões sociais, políticas e científicas) e é um assunto que suscitou interesse, sobretudo no seguimento da aprovação em Portugal da lei do "casamento homossexual", pelo que houve consenso em explorá-lo em reuniões próximas.
Caminhamos através das descobertas da partilha para melhor podermos ajudar os outros e contagiar mais pessoas a fazerem o mesmo, caminhando connosco!